Este ano que passou, 2018 — sinto que é até um sacrilégio referir-me a 2018, como se já estivesse tão morto e enterrado que nem devia estar falar nele —experimentei muita coisa nova. Experimentei-me a mim, sobretudo, sendo o melhor que sei ser, e fazendo o pior possível com isso a mim mesma.
Como profunda escorpião que sou, atirei-me à fogueira das emoções mais profundas e andei lá a bater com a cabeça, o coração e a regar tudo com lágrimas. Dei tudo a quem não tinha como retornar coisa alguma. Fui peça em vez de pessoa, não uma, mas duas vezes. Percebi que a minha energia, normalmente tão luminosa, tão criativa, tão redemoinho-por-vezes-furacão, também se esgota, também se acaba e arrasta o meu corpo com ela. E com tudo isso, dois-mil-e-dezoito foi lindo. Apaixonei-me, observei-me, recolhi-me, abri-me, dei-me e, finalmente, descobri o amor incondicional. Descobri quem sou com quem não me via, porque não tinha como. Descobri o que é amar sem saber no que vai dar, sem prender, simplesmente amar no momento, porque o destino ninguém controla. Descobri que amo a mais pura verdade do ser e a intimidade da alma. Descobri que sou amor em estado puro — e em todos os outros estados, também. Descobri que o amor não se bloqueia, não se corta, não se impede. O amor flui como água. Toma muitas formas, tal como a água. Pode ser fervente e logo se evapora, e depois vai-nos pingando de volta no coração.
Em 2017, alguém me apelidara de Sarita (ler com sotaque indiano, sff.). Significa riacho, ribeiro, curso de água. Demorei um bocadinho a integrá-lo, mas nunca um apelido foi tão bem aplicado, porque é mesmo assim que me sinto.
O amor que sinto, o amor que sou, é como água, fluido, e imparável, ainda que sujeito às mutações das circunstâncias. Ora seca e se evapora para ir chover mais adiante, ora se infiltra e alimenta e anima a vida em quem resseca, ora jorra com mimos e atenções, ora observa de longe como uma núvem no céu. Também pode gelar e cortar como facas, ou embater de frente e destruir se o obstáculo for demasiado grande ou repentino. Mas sempre lava. Sempre clareia. A água não se segura, não se contém. Água contida é água morta. Esvai-se pelas brechas e poros de contentores incontinentes... A bem ou a mal, toma os aromas daquilo que toca, incorpora as impurezas, e depois precisa de voltar à terra para filtrar tudo isso. Por vezes, até chega a servir de esgoto, mas até isso, o amor leva para transmutar. Mas, acima de tudo, o meu amor nutre, vivifica, devolve à vida, assegura a vida, e retempera para que sigamos adiante.
Em 2018, aprendi que "exclusão" é um termo técnico que até os mais treinados para o identificarem e corrigirem, a praticam e a prescrevem. Comprovei que não há santos nem gurus perfeitos, e que nenhum, nenhum, pratica a 100 por cento aquilo que apregoa. Que todos estão sedentos de amor, também. Por muito que dêem, estão sequiosos de o receber. E que por muito que me sugerissem ser gelo, a humidade penetra sempre até aos ossos, e eu como a água, lá me vou imiscuindo-me até chegar à verdade do ser, ao cerne de cada questão. Vou até ao fundo, ainda que isso me custe a minha pureza, a minha qualidade cristalina, ainda que depois tenha de me ferver para me libertar do que não é meu. É a minha natureza. E eu confio na natureza. Ela também é fluida.
Sou água: eu molho, refresco, sacio, lavo e purifico, até posso levar tudo de enxurrada, conforto e desconforto e entranho-me até à alma. Sem água não há vida. E quando nasce, do meio das pedras, do alto da montanha, das profundezas da terra, ela não sabe onde vai desaguar. Simplesmente, flui.
Alguém me sugeriu: Contacto zero! Pois. Mas um copo de água não se recusa a ninguém.